Natanael anda cabisbaixo pois desde que chegou em sua nova escola não conseguiu fazer amigos.
Naquela tarde, pegou o lanche que a escola fornecia e guardou. Não tinha fome.
Voltando para casa, passou por um mendigo e lhe entregou o lanche.
Então ouviu: - Obrigado. - pequena pausa - A vida sem amigos, costuma ser sofrida.
O menino retorna e senta ao seu lado.
- Sinto falta dos meus amigos. Nessa escola só tem gente chata.
Abrindo o pacote do lanche e sem olhar para o menino ele comenta:
- Quando não estamos abertos à novas amizades, achamos que ninguém é bom o suficiente. Mas tenho um desafio para você.
O homem lhe pede que escolha uma criança de sua classe entre as três que considera as piores para ganhar um presente no Natal. Deve entender seus problemas, suas motivações, o que há por trás da maldade. Só crianças boas devem ganhar presente.
- Se você conseguir, você também ganhará um presente. Se não, ninguém ganha.
A partir desse dia começa a observar as três crianças escolhidas com mais atenção.
Marcelo, o valentão, tem dois amigos, que mais parecem capangas. Sempre de cara feia, intimida quem se aproxima. Natanael jamais tentou falar com ele.
Solange é estranha. Está sempre maquiada, usa uns acessórios chamativos e 'se acha'. Um dia, Natanael encostou nela sem querer. Ela esbravejou: - você é tonto menino? Vê se anda direito.
Alfredo, com seus óculos grandes e nariz empinado, sempre tira as melhores notas. Não fala com ninguém, não ajuda ninguém. Como alguém assim pode ter alguma bondade?
No dia seguinte, ao sair da aula, em vez de estar grudado ao celular, estava atento e percebeu que Marcelo seguia pelo mesmo caminho que ele. Manteve o ritmo para não perder a proximidade. Já um pouco distante da escola, ao virarem numa esquina se depararam com um menino apanhando de dois outros maiores. Marcelo não pensou duas vezes e entrou no meio para defender menor. Vendo que seu colega de sala poderia apanhar, Natanael se juntou a ele. Não demorou para que espantassem os dois. O menor também se foi.
Marcelo falou: - Obrigado por me ajudar.
Natanael balançou a cabeça rapidamente como que dizendo que ele não precisava agradecer e perguntou:
- Você o conhecia?
- Não. Mas não ia deixar alguém indefeso apanhar.
Natanael levantou as sombrancelhas, arregalando os olhos surpreso e dizendo:
- Sério? Você não passa uma imagem de defensor dos fracos.
Marcelo apertou os lábios, olhou para Natanael, depois demoradamente para o chão, então voltou o olhar, e disse:
- Eu vou te falar porque você me ajudou, mas se disser para alguém, quebro seu nariz.
Novamente sombrancelha levantada, olhos arregalados, Natanael pensou: onde estou me metendo?
- Passo por isso em casa. Meu pai chega meio alto, todo valentão, algumas vezes quer bater na minha mãe e eu tenho que defendê-la. Colocá-lo na cama para que durma. No dia seguinte, tudo fica bem. Mas aprendi que temos que ajudar os mais fracos.
Uns dias se passaram até que ele pudesse ter uma experiência com Solange. Estavam parados na frente da escola quando uma mulher muito bonita desceu do lado do passageiro de um carrão preto e veio em direção a ela:
- Se endireite e ajeita esse cabelo. Você está parecendo uma bruxa.
A menina a seguiu cabisbaixa, ajeitando o cabelo enquanto se dirigia ao carro.
No dia seguinte, ao vê-la sentada num banco de cimento na hora do recreio, Natanael se aproximou:
- Queria lhe dizer que você não parece um bruxa.
- O que você está falando, pirralho?
- Eu ouvi a mulher ontem lhe dizendo essa besteira.
- Minha mãe - ela falou, agora num tom mais moderado, enquanto baixava os olhos entristecida.
- Não achei legal o que ela falou. Você é bonita. Principalmente no final da aula quando sua maquiagem não está tão forte.
- Você está me xavecando?
- Não - riu - queria que soubesse que você não parece uma bruxa. - disse já saindo quando ela o chamou:
- Pirralho! - ele se virou - obrigada!
Natanael pensou: - Ela é apenas uma garota com uma mãe sem noção.
Prestando atenção em Alfredo, percebeu que ele sempre chegava mais cedo, nunca saía da sala no recreio e, ao final da aula, sempre esperava que o tumulto acabasse. Só então se levantava e ia, sem falar ou se despedir de ninguém.
Não gostava das atividades em grupo, nem mesmo das aulas de educação física.
Apesar das boas notas, ele corava e tinha dificuldade para responder quando algum professor o questionava em sala.
Elaborou um plano para se aproximar. Chegou cedo, fingiu que procurava sua caneta sem encontrá-la. Então chegou perto de Alfredo e falou:
- Você tem uma caneta para me emprestar?
Sem levantar os olhos, Alfredo pega uma caneta e a conduz na direção da mão de Natanael.
Ao fim da aula, se aproxima, senta na cadeira à frente do colega e agradece:
- Muito obrigado. Você foi maneiro. Sou o Natanael. Acho que nunca conversamos.
Durante mais alguns dias continuou se aproximando, fazendo algum comentário e, logo, Alfredo começou a trocar algumas palavras com ele.
Percebeu que Alfredo era muito tímido. Só ia bem nas provas porque eram escritas. Como os outros, era um menino de bom coração.
Foi para casa pensando nas palavras do mendigo: " Se você conseguir identificar uma criança boa, você também ganhará um presente. Se não, ninguém ganha". Mas ele não conseguiria escolher. Percebeu que todos eram bons.
Com esse pensamento, sentou numa poltrona enquanto esperava o almoço.
Viu o mendigo se aproximando e dizendo:
- Vocês todos ganharam presente. Marcelo, tem conversado bastante com você e está melhor depois que conseguiu compartilhar as dificuldades que enfrenta em casa. Já vi Solange sorrindo pra você mais de uma vez, fora os chocolates que ela costuma lhe dar. Tem usado maquiagem com mais moderação, ficando mais bonita. Alfredo ganhou um amigo para ajudá-lo a superar sua timidez. Tem feito pequenos avanços, como por exemplo, desejar bom dia ao porteiro da escola.
E você? Ao sair do seu mundinho, deixar o celular de lado e observar seus colegas, pôde perceber o lado bom de cada um deles. Ganhou três amigos, ganhou alegria e vontade de ir para a escola.
Vocês todos ganharam seus presentes.
Ouviu sua mãe chamando e abriu os olhos. A conversa com o mendigo foi um sonho.
Natanael agradeceu em pensamento por aquele encontro com o mendigo e pelo seu presente: novos amigos.
Que essa história possa inspirá-lo a buscar o que há de melhor nas pessoas. Só assim terá um dos melhores presentes que a vida pode lhe oferecer: amigos.
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